O Que Ninguém Te Conta Sobre Avaliação de Performance de Pessoas Staff+
A Realidade Por Trás das Reuniões de Calibração
O Teatro da Performance Review
As reuniões de calibração de performance são, em teoria, projetadas para garantir justiça e consistência nas avaliações. Na prática, representam um dos processos mais problemáticos e pouco discutidos nas organizações de tecnologia. A verdade incômoda é que essas reuniões frequentemente introduzem mais viés do que removem.
Durante essas sessões, múltiplos engenheiros são avaliados simultaneamente por um comitê que pode incluir pessoas de áreas completamente diferentes como financeiro, produto, marketing, etc, muitas das quais nunca trabalharam diretamente com o engenheiro sendo avaliado. O gerente direto tem apenas alguns minutos para “vender” cada membro de sua equipe, transformando avaliações de performance em competições de pitch onde a habilidade retórica do gerente importa tanto quanto o trabalho real do engenheiro.
A Síndrome do Recency Bias
Um dos vieses mais devastadores em avaliações de Staff+ é o recency bias, ou seja, a tendência de dar peso desproporcional a eventos recentes. Imagine um Staff Engineer que entregou uma migração crítica de arquitetura nos primeiros seis meses do ano, mas teve uma falha visível no último mês antes da revisão. Estudos mostram que esse engenheiro provavelmente será avaliado principalmente pela falha recente, com seus sucessos anteriores ofuscados pela facilidade de lembrar eventos próximos.
O fenômeno é especialmente cruel para engenheiros Staff+ porque seus projetos têm horizontes de tempo mais longos. Uma iniciativa estratégica iniciada em janeiro pode não mostrar resultados até dezembro, mas se houver um problema de produção em novembro, é isso que ficará na memória durante a reunião de calibração de dezembro.
Como mitigar: Implementar sistemas de documentação contínua com checkpoints trimestrais, onde sucessos são registrados assim que acontecem. Gerentes devem manter “journals” estruturados de realizações da equipe ao longo de todo o período de avaliação, não apenas nas últimas semanas.
O Problema do Budget Constraint: Há Mais Merecedores do Que Dinheiro
Esta é talvez a verdade mais brutal e menos discutida: mesmo em empresas ricas, os orçamentos para méritos e promoções são artificialmente limitados. Dados de 2024-2025 mostram que empresas de tecnologia estabelecem budgets médios de apenas 3.3-3.5% para aumentos por méritos, com budgets totais (incluindo promoções e ajustes) chegando a apenas 3.6-3.7%.
Isso significa que em uma equipe de 10 engenheiros Staff+, mesmo que 7 deles tenham performance excepcional, matematicamente apenas 2-3 poderão receber aumentos significativos ou promoções. O resto, independentemente do mérito, ficará de fora simplesmente porque o dinheiro acabou.
A Mecânica Perversa das Cotas
Muitas organizações implementam sistemas de forced ranking ou stack ranking, onde gerentes são obrigados a distribuir suas equipes em categorias pré-definidas, por exemplo, 20% top performers, 70% meets expectations, 10% underperformers, independentemente da performance real da equipe.
Este sistema cria situações absurdas:
O bottom 10% de uma equipe de elite pode ser top 10% em outra equipe
Um engenheiro que está há 3 anos como Staff pode ser promovido simplesmente porque está em uma DG com distribuição favorável de antiguidade, enquanto um engenheiro idêntico em outra área é negado pela matemática das cotas
Mesmo equipes onde todos são high performers devem rotular alguns como “não atende expectativas”
O impacto é devastador: empresas que usam forced ranking viram declínio de 14% em indicadores de engajamento comparado a outros métodos de avaliação. A taxa de turnover também aumenta, pois engenheiros rotulados como bottom performers, mesmo sendo adequados, tendem a sair.
O Jogo da Visibilidade: Quem Tem o Melhor Pitch Vence
Affinity Bias: O Viés Mais Insidioso
O affinity bias é particularmente problemático em avaliações de Staff+. Trata-se da tendência inconsciente de favorecer pessoas que se parecem conosco, seja por background educacional, interesses compartilhados, estilo de comunicação ou até características demográficas.
Em reuniões de calibração, este viés se manifesta quando:
Gerentes gastam mais tempo defendendo engenheiros com quem têm rapport pessoal
Stakeholders de áreas não-técnicas dão ratings mais altos para engenheiros que compartilham seus interesses (mesmos hobbies, mesma universidade, mesma cidade de origem)
48% dos gerentes de RH admitem que viés impactou suas escolhas de candidatos, com um em cada dez dizendo que não conseguiriam contratar uma mulher para um papel dominado por homens
O resultado? Para cada 100 homens promovidos a posições gerenciais, apenas 72 mulheres recebem a mesma oportunidade, não por falta de mérito, mas porque os tomadores de decisão (majoritariamente homens) tendem a promover pessoas “como eles”.
Proximity Bias: O Preço do Trabalho Remoto
Para pessoas que trabalham remotamente, há um obstáculo adicional: o proximity bias. Managers inconscientemente favorecem funcionários que veem fisicamente no escritório, mesmo quando o trabalho remoto produz resultados idênticos ou superiores.
Dados revelam:
Trabalhadores remotos têm menor probabilidade de serem escolhidos para projetos de alta visibilidade
Nas reuniões de “talent calibration”, líderes tendem a nomear pessoas com quem têm familiaridade presencial, pois essas estão “top of mind”
Mães que trabalham remotamente são avaliadas mais severamente que pais remotos quando não atingem metas, devido a estereótipos de gênero ativados pelo contexto remoto
O fenômeno é tão significativo que pesquisadores identificaram uma solução surpreendentemente simples: fornecer dados objetivos sobre horas trabalhadas eliminou completamente o gender gap nas avaliações de trabalhadoras remotas.
A Importância da Self-Promotion
Aqui está uma verdade desconfortável: performance excepcional não é suficiente se ninguém souber dela. Em culturas corporativas competitivas, especialmente aquelas com stack ranking ou OKRs agressivos, engenheiros que não praticam self-promotion efetiva ficam invisíveis.
No entanto, há uma linha tênue. Pesquisas mostram que existe diferença entre “strategic self-promotion” e “overt bragging”. O primeiro é apresentar suas conquistas de forma clara e baseada em fatos. O segundo é auto-congratulação constante que pode ser contraproducente. [20]
Estratégias efetivas para Staff+ Engineers:
Criar um brag document (documento de conquistas) atualizado continuamente
Realizar demos regulares do trabalho para audiências relevantes
Articular claramente o impacto de negócio das contribuições técnicas
Usar métricas objetivas sempre que possível
Um estudo revelador mostra que engenheiros que mantêm brag documents têm maior probabilidade de receberem promoções, não porque são mais qualificados, mas porque conseguem articular seu valor de forma mais efetiva durante revisões.
No próximo artigo desta série, você entenderá como pode mudar o foco no seu trabalho para ter maior impacto, melhor visibilidade e consequentemente ter changes maiores de consegurir um mérito ou promoção.
Quem é Janderson Silva?
Sou Software Engineer, autor do livro “Influência sem Autoridade: A Arte da Liderança Técnica” e mentor de carreira.
Vem fazer mentoria comigo e entender como eu e meus mentorados conseguimos evoluir continuamente no universo que existe depois do nível Sênior!
Referências
How Calibration Meetings Introduce Bias into Performance Reviews
Harvard Business Review: How Calibration Meetings Introduce Bias into Performance Reviews
How to set an annual compensation budget: HR-led vs Finance-led
Do we need to move away from forced ranking in employee performance evaluation?
How HR Can Identify and Overcome Affinity Bias in Hiring and the Workplace
How to overcome proximity bias in performance reviews for hybrid teams
The hidden bias: Ten reasons why visibility still beats performance in the remote work era
Beyond Bragging: How to Navigate Self-Promotion in Competitive Tech Cultures


